Natural de Rio das Pedras (SP), Carlos Joussef estudou em cursinhos de Piracicaba. Em seguida, saiu daqui para cursar medicina na faculdade de Ribeirão Preto, onde optou pelo ramo da ginecologia e obstetrícia. Em 1985, retornou à cidade de Piracicaba, onde permanece até hoje.
Joussef tornou-se presidente da Unimed Piracicaba em 2012, por meio de um pleito. Agora, em março deste ano, foi novamente eleito para estar à frente de uma das mais respeitadas instituições médicas do país. Este é o terceiro mandato de Joussef à frente da Unimed, cooperativa líder no mercado de planos de saúde de Piracicaba.
Nesta entrevista concedida ao jornalista Rafael Fioravanti, do Jornal PIRANOT, o médico de 60 anos conta um pouco de sua gestão na Unimed, fala sobre os futuros investimentos do hospital, tece uma auto-crítica à sua gestão, e claro, diz o porquê de ter sido escolhido por seus companheiros para presidir o hospital.
No ano passado, a Unimed Piracicaba recebeu nível 3 de excelência da ONA (Organização Nacional de Acreditação). Esse prêmio é muito difícil de ser conseguido, apenas 1,4% dos hospitais do país o recebem. Como presidente, a que o senhor atribui esse reconhecimento?
Investimentos. Nesses seis anos passados da nossa gestão, investimos em melhorar o hospital, em qualificar o atendimento dos colaboradores, em estrutura, tecnologia, instrumentais, etc. E tentamos também investir na organização hospitalar para que o paciente fosse acolhido na humanização — por exemplo, temos psicólogos e terapeutas 24 horas por dia. Isso era coisa que não existia e poucos hospitais têm isso. Nós estruturamos a Unimed o máximo que a gente pôde. Sem deixar de falar nos investimos que também fizemos na segurança do paciente. E claro, a ONA se baseia muito em tudo isso. Porém, só isso não basta, há mais coisas que precisamos acrescentar. Precisamos de qualidade médica. O Brasil forma 35 mil médicos por ano e você verá que a depuração ocorrerá pelo próprio mercado de trabalho. Está ocorrendo uma massificação com a profissão do médico, da mesma forma que ocorre com engenheiros, professores e diversas outras profissões. Então, sobreviverá no mercado de trabalho somente aqueles que tiverem qualidade. Quem não tem qualidade, terá dificuldade em encontrar emprego, principalmente nos grandes centros. Essa é a tendência natural da medicina. Tem planos de saúde que pagam menos ao médico? Tem! Mas veja se um médico de qualidade atende por um plano de saúde ruim. A maioria não atende, mas chegará um momento em que terá que atender, pois esse médico não terá outra opção. A Unimed é um plano que ainda dá porto seguro para o médico, então ainda é mais fácil de conduzir os processos de acreditação. Nós investimos no médico e no corpo clínico. Isso tudo faz a Unimed ser conduzida de maneira melhor. Através disso, é possível oferecer ao paciente uma medicina melhor.
Esse reconhecimento da ONA mostra que a Unimed Piracicaba é uma instituição de qualidade, isso é inquestionável. Porém, eu gostaria que o senhor fizesse uma auto-crítica e me dissesse o que ainda precisa ser melhorado na Unimed.
Este ano é ano de qualificação médica, estamos batendo nessa tecla e estamos batendo firme. Porém, não é fácil expôr esse tipo de problema para os seus colegas, concorda? É difícil, porque ninguém nunca fez isso. É a primeira vez que a Unimed expõe alguma coisa. Então, quando isso acontece, ela vai de encontro à imagem da empresa. Quanto melhor a qualidade, melhor a imagem da empresa; quanto mais problemas eu tenho atrelado a uma imagem ruim, pior a imagem da empresa. As pessoas atualmente querem pagar para obter qualidade — nos outros planos eu não sei, porque as pessoas pagam bem menos; mas da Unimed as pessoas cobram qualidade. E a qualidade da Unimed é indiscutível. Eu falo isso tranquilamente e consigo provar. Se alguém de outro plano chegar para mim e falar qualquer coisa, eu posso responder a ele que a qualidade que ele possui não se compara à qualidade da Unimed. Hoje, nós damos muita estrutura para o paciente. Nós temos uma medicina preventiva boa, temos uma domiciliar boa, temos um hospital humanizado, temos um número de funcionários por leito maior que qualquer outro hospital de Piracicaba e região. Em termos de qualidade, nosso hospital hoje é igual a muitos hospitais de São Paulo. E a complexidade também está chegando, nós iremos inaugurar agora um serviço de cardiologia com coronariana, hemodinâmica, PA cardiológico, uma unidade intensiva de pediatria, e estamos inaugurando também vários outros serviços no nosso hospital — um investimento de R$ 10 milhões de reais para que, até novembro, tudo já esteja funcionando. Nossos médicos atualmente estão sendo avaliados e nós estamos discutindo quais médicos irão trabalhar nesses serviços. Hoje, não basta apenas ser um cooperado, o médico precisa ter qualificação para tal. Então, a minha autocrítica é justamente esta. A Unimed vai bem financeiramente, se estabilizou e agora está crescendo. Mas chega uma hora que é necessário depurar um pouco a qualidade médica. Essa depuração é imprescindível, pois hoje a Unimed tem um choque de gerações. Temos uma cooperativa 60% acima dos 60 anos de idade. E essa depuração nós só faremos com gente jovem e capaz.
Hoje, as pessoas dispõem de diversas opções de planos de saúde na Unimed e cabe a elas contratarem o plano que melhor se adapta a elas. Vale lembrar, porém, que o valor destes planos de saúde encarece bastante conforme envelhecemos. Eu gostaria de saber qual é a estratégia da Unimed para atrair mais idosos aos planos de saúde levando em consideração o alto valor cobrado atualmente.
O que acontece é o seguinte: poucos planos hoje estão vendendo pessoa física, ninguém mais quer vender, porém a Unimed Piracicaba ainda vende. A maioria dos hospitais não quer mais vender por causa desse ponto-chave que você falou. Quem quer vender um plano para uma pessoa idosa, por maior que seja o preço? A hora que ele tiver um câncer, é necessário levar em consideração que um mês — um mês! — de quimioterapia custa cinco anos de contribuição. As drogas monoclonais e os imunobiológicos são caríssimos. Por exemplo, num tratamento de hepatite C, um paciente custa em torno de R$ 500 mil reais. Suponhamos que ele seja idoso e pague R$ 1,000 reais por mês, quanto tempo vai demorar para ele pagar o tratamento dessa hepatite? É só fazer as contas. Muitas vezes, o paciente morre e sequer chega a arcar com o custo. Então, o problema é que ninguém quer vender planos para idosos, mas nós ainda vendemos. A longevidade (expectativa de vida) do brasileiro mudou. Há 15 anos, a expectativa de vida do brasileiro era de aproximadamente 60 anos de idade; hoje, a expectativa é de 77 anos. Nós estamos quase chegando à expectativa de vida do Japão — aliás, perdemos apenas para o Japão e Estados Unidos. Por isso, ninguém quer pegar um idoso. Um homem de 60 anos de idade ainda viverá bastante. A curva atuarial está se tornando um barril, sendo que antes era uma pirâmide (a base larga de jovens e a ponta fina de idosos). Essa pirâmide hoje é achatada e a mesma faixa que está em baixo, está também no meio e em cima. Essa é a população do Brasil atualmente.
Quais ações a Unimed pretende pôr em prática num futuro próximo?
Nós já compramos vários equipamentos novos e iremos inaugurar todos até novembro — entre eles, aparelhos para angiotomografia, dois ultrassons, instrumentais, etc. Isso era o que nós tínhamos programado para este ano. Atrasou um pouco em virtude de uma série de coisas, porém inauguraremos tudo até novembro. Atualmente, também compramos do Clube Cristóvão um terreno de 11,500 m². Nesse terreno, nós construiremos um complexo hospitalar e administrativo. Era para as obras estarem começando este ano, mas como houve esse atraso, pretendo começar no começo de 2019. Será um complexo hospitalar novo, onde faremos o administrativo, a auditoria, a contabilidade, enfim, tudo. Nós também faremos nesse terreno um complexo preventivo e domiciliar. Talvez a Unimed só fique com o prédio da Rua XV de Novembro por questões históricas, já que aquele foi o primeiro prédio.
A saúde pública precisa ser melhorada, ela está longe de ser satisfatória e todos nós sabemos disso; porém, um plano de saúde é também um sonho distante para muitas pessoas. O senhor acha possível uma integração entre o setor público e privado?
Acho perfeitamente possível, aliás, essa é a única saída que o setor público tem a curto prazo. Aqui em Piracicaba, nós estamos em contato com a Prefeitura e posso dizer que, nesse sentido, já estamos em fase de conversas bem avançadas. Já estamos, por exemplo, fazendo alguns exames para a Prefeitura no Hospital da Unimed. Hoje mesmo (dia 19), eu recebi uma lista de 231 eletroencéfalogramas para crianças. Já fizemos 50 e agora a Prefeitura mandou mais esse lote. Por enquanto, estamos fazendo como cortesia. Na cidade ninguém faz esse exame e ninguém tem esse exame, apenas nós. Ninguém quer fazê-lo. Ou seja, estamos com uma licitação de exames que eles estão precisando, mas que seguem com dificuldade na rede pública — exames como mamografia, ultrassom, endoscopias, enfim, dezenas deles. E temos também um outro projeto, que não posso falar ainda, mas que já está em licitação.
Por fim, quais são as suas considerações finais para os leitores?
Eu acho que nós, aqui no Brasil, estamos com um defeito muito grave: nós rotulamos as coisas muito facilmente. Ah, é difícil fazer aquilo! Mas será que é realmente difícil? Aquilo lá é impossível! Será que é mesmo impossível? Aquilo é complicado! Mas será que aquilo é realmente complicado? Todo mundo vive falando que as coisas são complicadas, difíceis, impossíveis, mas essas palavras não existem no meu vocabulário. Isso não existe na minha cabeça. Tudo é possível. Só tem duas coisas que são certas na vida e todo mundo que assistiu o filme “Encontro Marcado” sabe: a morte e os impostos. Essas são as únicas coisas certas na vida, o resto a gente pode tentar. Então, a minha crítica para o país é que parece que as pessoas não acreditam que as coisas podem realmente acontecer. Einstein falava: “o impossível só existe até que o tornemos possível”. E eu busco o impossível sempre. Sempre busco o impossível para conseguir o possível. Eu acho que gestão em saúde não é difícil, é fácil arrumar isso. Só que a gente precisa pensar, precisa sempre estar analisando as coisas. Só faz gestão em saúde quem tem conhecimento. Sem conhecimento médico, sem conhecimento administrativo e sem um pouco de radar cerebral, você não consegue as coisas. Não adianta ser apenas um bom administrador ou apenas um bom médico, você precisa fazer as coisas andarem juntas. Tem que ter ritmo e tem que ter cronologia. Às vezes, temos que ter muita paciência, mas às vezes também não podemos ter paciência em excesso. Eu tenho uma personalidade assim: tudo quero para ontem. Mas aqui, na gestão da Unimed, eu aprendi a ter paciência com algumas coisas. É preciso paciência para lidar com as pessoas, mas não muito! Paciência tem que ter limite. Eu estou há seis anos e meio aqui na gestão, você acha que não teve gente que já passou dos limites da minha paciência? Tem pessoas aqui que já saíram do meu limite, e para eles minha paciência já acabou. Eu dou tempo para as pessoas se adaptarem ao modelo, a gente nunca vem aqui e toma uma decisão de guilhotina. A gente dá chance às pessoas, mas quando tomamos decisões, é porque a paciência já acabou. Então é isso que o Brasil precisa aprender a fazer. Acabou a nossa paciência para insegurança, violência, desemprego, a paciência já acabou para um monte de coisas e parece que não está acontecendo nada. As coisas não podem ser tão difíceis de serem feitas como todo mundo fala, eu acho que falta vontade, atitude e telhado. Para finalizar, minhas considerações são as seguintes: a sua credibilidade, a sua transparência e a história da sua vida dão esperança para qualquer pessoa, independente da cor que ela é. Eu posso ter muitos defeitos, porém tem alguns defeitos em específico que a gente não pode ter. Eles cabem numa mão. Numa gestão, a pessoa não pode ser desonesta, não pode ser mal caráter, não pode mentir e espera-se de um gestor que ele tenha a postura ilibada. O gestor tem que ter a vida limpa, seu telhado tem que ser forte. É essa postura que eu tenho para a minha vida, e talvez eu tenha chegado à presidência da Unimed por conta disso.