Nascido em 08 de dezembro de 1950, Barjas Negri é o atual prefeito de Piracicaba. Nesta entrevista concedida ao jornalista Rafael Fioravanti, do Jornal PIRANOT, o prefeito fala sobre a sua gestão, sobre a crise no Semae, sobre a saúde no município, sobre a busca de recursos para a execução de projetos e sobre muitos outros temas. Entrevista inédita que o prefeito concedeu ao PIRANOT no dia 26 de junho.
Como se deu seu envolvimento com a política?
Fui estudante do curso de Economia da Unimep (Universidade Metodista de Piracicaba) e eu tinha bons professores, oriundos de cidades como São Paulo, Campinas e São Carlos. Eram cursos abertos e aí acabei tendo um envolvimento com o Centro Acadêmico. Fiz parte da diretoria do Centro Acadêmico do Centro de Ciências Aplicadas pelo menos umas duas vezes. Depois acabei fazendo Mestrado na Unicamp, o que também acabou abrindo ainda mais a minha cabeça. Naquela época, existiam apenas dois partidos políticos: MDB e Arena. Quem não estava com o governo, estava com o MDB. Me filiei ao MDB para participar das campanhas, e, em cada uma delas, procurava me envolver — ora apoiando um deputado, ora apoiando um governador, ora apoiando um prefeito. Quando participamos da carreira acadêmica de forma mais intensiva, acabamos inevitavelmente participando mais da política. Isso é normal dentro do meio acadêmico.
Quando o senhor começou sua gestão, qual era o maior desafio e por quê?
Eu tinha vários desafios, porém um deles era mudar a dinâmica do crescimento da cidade. Piracicaba era uma cidade boa, tinha um parque industrial relativamente bom, mas isso precisava se intensificar (estava muito concentrado em alguns setores). Por isso estimulamos a criação do Distrito Industrial, do Unileste, do Uninoroeste e do Parque Automotivo, que acabou trazendo Hyundai e demais fornecedores para ajudar no desenvolvimento da cidade. Tínhamos também uma coisa que passava despercebida: a questão da mobilidade. Piracicaba é uma cidade que, naquela época, já tinha uma quantidade significativa de veículos por habitantes. Mas a malha viária era inadequada. Na época projetamos que, se a cidade continuasse crescendo naquele ritmo, haveria estrangulamento no sistema viário. Daí projetamos o alargamento de avenidas, pontes e viadutos. Articulamos com o Estado para a ampliação das estradas, o que acabou surgindo daí a duplicação da Rodovia do Açúcar, o Anel Viário, etc. Então todas essas ideias surgiram lá atrás por conta do número crescente de veículos; para mim, aquilo também era uma coisa nova na época. Tudo isso, por fim, mostrou-se acertado, porque hoje nós temos 315 mil veículos licenciados em Piracicaba; deste número, 65 mil são motos; o resto se trata de veículos utilitários. E Piracicaba é um polo. Nós temos alunos que vêm para estudar na Anhanguera e na Unimep, temos pessoas que vêm ao Shopping, temos pessoas que vêm na Rua do Porto aos finais de semana, há muitos veículos circulando pela cidade.
Existia alguma outra questão significativa em pauta na época?
Tínhamos a questão do saneamento básico. Piracicaba tinha cerca de 20 favelas que não eram urbanizadas. A água e a energia funcionava na base do gato, então precisávamos fazer um trabalho de urbanização nestas favelas. Havia ali cerca de três mil famílias, isso não é pouca coisa. Levamos para lá água, fizemos a coleta de esgoto, melhoramos o ambiente dessas comunidades, transformamos o local em bairros e melhoramos a saúde. Esse investimento constante no saneamento básico e no esgoto fez com que Piracicaba se tornasse o primeiro município do Brasil em saneamento. Às vezes, os próprios piracicabanos não têm noção do que isso significa. Quando eu viajo para debates fora de Piracicaba, todos vêm perguntar: “Mas como é isso?”, “Como se chegou a isso?” Aqui ainda não se há a dimensão do que é uma cidade com todas as casas abastecidas com água e coleta de esgoto. Tratar esgoto não é um capricho da Prefeitura, tratar esgoto é uma questão de meio-ambiente e de sustentabilidade. Assim se recupera, por exemplo, o Ribeirão Piracicamirim, do Córrego do Enxofre, dos Marins, das Ondas e do Guamium. Hoje esses córregos não têm mais lixo ao céu aberto. Estamos preservando uma coisa importante para o futuro.
Atualmente Piracicaba enfrenta uma série de problemas. Como o senhor define o que é prioridade para, assim, direcionar o investimento?
Eu sempre trabalhei com planos. O plano é uma ideia do que vamos fazer com a educação, saúde, desenvolvimento social, desenvolvimento econômico, com a cultura, etc. Temos um plano e vamos seguindo-o, sempre fazendo ajustes durante o caminho. Às vezes, as pessoas criticam: “Pô, mas você não cumpriu o plano!” Não se trata disso, é que o plano mudou. Se você pegasse o plano diretor de Piracicaba, ali não estava previsto um distrito industrial automotivo. É no meio do caminho que vamos adaptando esse plano. Aqui em Piracicaba eu posso dizer o seguinte: mesmo com todos os problemas, a área social da Prefeitura é bastante adequada se comparada com os municípios de mesmo porte, como Campinas, Sorocaba, Jundiaí, Araraquara, São Carlos, Taubaté, etc. Temos uma rede de equipamentos de saúde relativamente boa e que atende bem a população, temos uma rede de educação relativamente boa (com creches, escolas infantis, inclusão digital) e temos uma rede de desenvolvimento social também relativamente boa (com CREA’s, CAOF’s, CASE’s). Podemos até não resolver tudo, mas atendemos bem. E isso não é uma coisa minha apenas, todos os prefeitos anteriores contribuíram de alguma forma. A Prefeitura é bem organizada e possui uma rede bem articulada.
Barjas, o período para a economia está complicado, como e onde o senhor tem buscado recursos para possibilitar ações da Prefeitura?
Eu tenho uma experiência grande, trabalhei no município, no Estado, na Unicamp e no Governo Federal. Eu tenho contatos e, assim, faço os meus projetos. Vou elencar algumas coisas que pouca gente sabe: nesses dois anos, duplicamos a estrada Piracicaba-São Pedro, a partir de Artemis — isso foi uma articulação com o Estado. Concluímos o Hospital Regional. A Prefeitura o concluiu, o Estado o equipou e o encampou. O hospital custa mais de R$ 40 milhões por ano e isso não é a Prefeitura que paga, mas o Estado. Se pegarmos também o Projeto Ilumina, a Prefeitura viabilizou rapidamente um terreno de dez mil metros quadrados — em um mês, se nós não viabilizássemos o terreno, perderíamos o recurso. Falando do Ceasa, existia quatro quilômetros de estrada que estava deteriorado. Estamos refazendo esse trecho com o dinheiro do Estado — nós fizemos o projeto, articulamos com o Estado e estamos fazendo. Falando agora do Vida-Nova, o espaço ali ficou fechado por dois anos. Fomos para Brasília, conversamos com o Ministro das Cidades, depois conversamos com a presidência da Caixa, e assim conseguimos R$ 30 milhões de reais que acabou concluindo o Vida-Nova. Ele foi entregue em dezembro. Mas como o Vida-Nova não tinha escola, fui na Caixa Econômica e descolamos uma escola já em construção. Fui no Governo do Estado e consegui mais um dinheiro para a realização da creche. Falei com o Estado, e ele também licitou uma escola para Ensino Médio. Outro exemplo: A Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da Vila Cristina tem um custo de R$ 4,5 milhões. Eu peguei R$ 4 milhões com o Ministério da Saúde e entrei com a diferença. Agora há também o Hospital Veterinário. É claro que daremos uma contra-partida, porém tentaremos articular para pegar um dinheiro com o Estado. Eu estou falando isso, mas há vários outros exemplos. Eu concorro à eleição com um partido, mas quando venho para administrar, administro para toda a cidade. E o dirigente da União e do Estado têm o mesmo conceito. “Qual é o problema de Piracicaba?” Se eu apresentar um bom projeto, sai; caso contrário, não sai.
A saúde é uma das maiores preocupações, senão a maior, dos leitores do PIRANOT. Recebemos várias queixas referentes à falta de investimento em UPA’s, abandono, aparelhagens quebradas, falta de materiais básicos, etc. Como o senhor analisa essa questão?
Isso foi no ano passado. No ano passado realmente tivemos problema porque demorou para homologar a licitação dos medicamentos e insumos, então passamos um certo período com muito problema. Neste ano, essa questão está resolvida. Pode ser que haja uma coisa ou outra, mas não é algo permanente. Uma reclamação do povo que acho justa é a demora. É muito difícil explicar isso para a população. Não há falta de médicos, porque cada UPA nossa possui cinco médicos. Entre 30 minutos e 01 hora, todo mundo deveria ser atendido. Vamos supor que ocorre um acidente de moto e esse jovem acidentado é levado para lá. Nesse momento, os clínicos gerais param de atender os outros e dão prioridade a uma ocorrência que exige maior atenção. Por isso que a pessoa na fila já há 45 minutos, terá que esperar mais uma hora para ser atendida. Eu concordo que isso é uma coisa desgastante e difícil de ser entendida, mas temos que ter em mente que o médico deve focar nas prioridades.
Barjas, como o senhor acompanha a crise no Semae e a constante falta de água no município?
É constrangedor. A questão é que não falta água na cidade, até porque o Semae produz água suficiente para atender a população e a distribui. O que se faz de captação no Rio Corumbataí e no Rio Piracicaba é suficiente para a população. Às vezes, acontecem estouros de adutoras. Por exemplo, em janeiro, fevereiro e março, nós tivemos vários eventos constrangedores ao Semae e também à população, que ficou sem abastecimento. Uma delas: queda de energia na Estação do Capim Fino. Você desliga as máquinas e os reservatórios começam a diminuir. Se a energia não volta rápido, os reservatórios ficam baixos. Depois choveu bastante em Rio Claro, o que acabou fazendo com que uma terra barrenta descesse à Estação do Corumbataí. A água veio turva e os técnicos do Semae optaram por não captar a água. Então deixaram a água passar, pois, se a captassem, correria o risco de prejudicar as bombas. Ficamos três horas sem captação. Aí quando normalizou tudo estourou uma adutora. No sábado mesmo teve estouro de uma no Centro da cidade. Eu fui lá pessoalmente quatro vezes, de manhã, na hora do almoço e à tarde. Às 18h, finalizaram os serviços. Infelizmente quando foi por volta das 20h teve um novo vazamento de água. Voltei para lá umas 21h e constatei que eles tiveram que abrir o local de novo e chamar um soldador, pois a solda não havia ficado bem feita. Foi problema de pressão. Por isso faltou água na região do Cecap e Dois Córregos.
E o que está sendo feito para corrigir isso?
Temos um plano de R$ 30 milhões de reais. Estamos fazendo uma adutora que sai da Avenida Dr Cássio Paschoal Padovani e vai até o Unileste. Isso deverá resolver problemas naquela região. E agora para o segundo semestre, faremos uma licitação para resolver o problema da adutora na Rua Marechal Deodoro, que estoura sempre. Ali na Rua Monsenhor Rosa a cada dois ou três meses tem um problema. Nós faremos uma nova adutora ali e desativaremos essa atual para que, no ano que vem, não tenhamos tantos eventos negativos novamente. Então isso não é uma falha do Semae. O problema é que nossas redes são relativamente antigas e, em alguns lugares, há necessidade de troca. Nós pedimos desculpas à população, e sempre tentamos ser ágeis em comunicar os problemas à população. Quem mais sofre nesse processo são aqueles que não contam com um reservatório de água em casa, visto que as casas que dispõe de um reservatório de 500 litros, tem três ou quatro horas de água. O suficiente para que resolvamos o problema.
Falando um pouco de plano econômico, como o senhor vê o futuro do município?
Piracicaba é uma cidade que tem bons equipamentos sociais, de cultura, dispõe de uma malha viária relativamente boa e tem um parque industrial forte. A economia é sempre cíclica, sou economista e estudei muito isso durante minha vida. Na economia, dispomos de um crescimento seguido de um período de queda, depois volta. E isso é sempre ascendente. O problema é que estamos num período em que a queda foi muito forte e muito longa. A partir do momento em que a economia voltar a crescer um pouco, imagino que Piracicaba tenha condições de crescer acima da média. Quando a economia cresce, começa geralmente pelo setor industrial — e temos um parque industrial aqui. Isso significa também que sofremos mais, visto que, nos anos de 2014 e 2015, a crise começou por aqui, na Dedini, na Caterpillar e em outras indústrias também.
Qual tem sido o principal diferencial da sua gestão em relação às anteriores?
Na outra eu tinha um pouco mais de recursos e procuramos fazer investimentos para recuperar a infraestrutura da cidade — infraestrutura urbana e social. Nesta gestão temos menos recursos, portanto tenho que usar experiência, expertise e a equipe de trabalho para que a gente mantenha a Prefeitura funcionando bem. Quando sai um médico, temos que substituí-lo rápido; não podemos deixar faltar medicamentos; temos que resolver a questão do raio-x. Esse é o período de fazer a Prefeitura funcionar bem, sem fazer grandes investimentos. Nós fazemos um pouco mais de um milhão de atendimentos médicos por ano. E como a população de Piracicaba é de 400 mil habitantes, é como se cada cidadão do município tivesse dois atendimentos médico e meio. Isso não é pouca coisa. Fornecemos medicamentos para mais de um milhão de receitas médicas. Às vezes falta um ou outro medicamento num posto ou numa farmácia, porém não é algo anormal. A gente sempre atende aquele um milhão de receitas médicas que a rede produz. Esse é o período de se fazer mais com menos, temos que usar a criatividade.
Se o senhor tivesse que fazer uma auto-crítica, o que deve ainda ser melhorado?
Hoje é o tapa-buraco, que ainda é um sofrimento. Quem tem carro, vê isso. Os três meses de chuva coincidiram com os três meses sem o tapa-buraco. Normalmente nos meses de janeiro, fevereiro e março, o número de buracos na cidade aumenta. E como não tínhamos massa asfáltica para tapar os buracos, nós só chegaremos num ponto relativamente bom no mês de agosto. A Prefeitura tem uma equipe, no máximo duas, trabalhando nisso; ressalto que atualmente estamos com três equipe todos os dias: uma faz o serviço cotidiano, enquanto outra pega o atrasado.
Barjas, se tivéssemos que escolher uma pessoa que muito o influenciou, não só profissionalmente, mas também como pessoa, quem seria?
Eu tive um relacionamento muito bom dentro da Academia. No ponto de vista acadêmico, dentro da Unicamp, tive um professor chamado Wilson Cano, com o qual fiz pesquisas e minha tese de doutorado. Ele me ajudou muito nessa formação. Agora, se falarmos de setor público, trabalhei um bom período com José Serra. Ele foi secretário de Planejamento de Estado e eu fui coordenador de Políticas Sociais. Aprendi muito nisso. Posteriormente, trabalhei com o ministro Paulo Renato na Educação. Ele foi meu professor no Doutorado e, depois, tive a oportunidade de trabalhar com ele como seu principal assessor no Ministério.
Por fim, quais são suas considerações finais?
Foi um prazer conversar com você. Espero que tenha correspondido à expectativa sua.